A Herança da Chaxiraxi
António Gualberto do Rosário
A dançarina entrou em transe e começou a libertar-se.
Primeiro, das luvas. Depois, do vestido. Soltou as peças de roupa, uma a uma, até ficar completamente nua. E se confundiu absolutamente com o ritmo, a cor e o perfume que tomou conta do ar. Até cair em meus braços, com o serenar da música.
Amámo-nos. Como nunca o fizéramos. Sem qualquer pressa. Exploramos cada poro dos nosso corpos. Experimentamos todas as intimidades. Utilizamos todos os nossos sentidos. E fizemos todas as rotações possíveis. Tudo com enorme delicadeza. Obedecendo à mais perfeita harmonia e devoção . Como que respeitando a um ritual. Tântrico.
A rumba continuou a rodar, recriada pelo corpo e pela alma da Odete. Dessa vez acompanhei. Me perdi nos acordes e na batida dos instrumentos. Até à completa fusão. A Odete e eu. A música e o ritmo. Transfigurámo-nos numa estrela. Tornámo-nos no Sol, que subiu até ao zénite e inundou tudo com a mais intensa luz. A seguir, declinou e se escondeu nas águas dos nossos oceanos serenos, deixando atrás um céu glorioso, de intensa cor laranja..